27 de novembro de 2007

Menino Jesus

Chegou ontem, inesperadamente, enquanto eu descascava batatas para o jantar. Recebi um telefonema da Vera, contente com a sua prenda, e precipitei-me para o e-mail para ver se lá estava a minha, ou se me tinha calhado carvão. É que nem sempre sou bem comportada.

Mas o Menino Jesus foi bonzinho e deu-me uma a mim também.

23 de novembro de 2007

Descanse em paz

O meu telemóvel custou-me uma brutalidade. Sessenta contos. Parece-me mais obsceno hoje do que no dia em que os paguei com uma ligeireza que já não conheço, que não sei já bem quando foi, mas sendo contos deve ter sido há uns 7 anos. Não há como a subtracção de uma bolsa da FCT e a adição de 2 filhos e uma prestação bancária para relativizar estas coisas.

É um NOKIA qualquer coisa. Preto. Esguio. Mas de tamanho adequado à minha mão: não carrego desajeitamente em duas teclas quando tento marcar um número como me acontece com alguns dos diminutos modelos mais recentes. Estava afeiçoada a ele. Principalmente desde que lhe coloquei fita-cola para manter a bateria bem presa e não perder as chamadas a meio. Olhava-o e via ali um fiel companheiro. Vivido, com histórias. Que descanse em paz.

Agora fiquei com o do João. Custou-me esta decisão. Este, coitado, não tem a altivez do outro. É pequeno, atarracado. Nunca acerto na tecla para atender as chamadas quando o procuro no reboliço que é a minha mala. Perco imensas. Tem algumas feridas de guerra que me fazem olhá-lo com carinho. Mas não são cicatrizes feitas na minha mão, não lhes conheço os detalhes. Quem sabe, daqui a uns anos, serei capaz de um elogio fúnebre mais sentido.

Têm-me perguntado pelo número. Mantenho o antigo ou mudo-me definitivamente para o novo? Curiosamente não sinto o mesmo afecto pelo número como pelo objecto. O que me permite estar contactável há tantos anos, o cartão, parece-me mais fácil de deixar para trás. Principalmente estando todos os meus contactos na memória do telefone.

Começo, portanto, uma nova lista. Digo assim, de forma passiva, adeus a contactos antigos que não tive coragem de apagar. Como o do Luis. E o do meu avô.

14 de novembro de 2007

Um copo d'água

Num café onde parei ocasionalmente, como em tantos outros, um rapaz entrou e pediu um copo de água. Pela primeira vez na vida ouvi, pasma, as razões de um comerciante para não aceder ao pedido. Que vendia era garrafas de água, não era copos. Que estava ali desde as 5 da manhã. Que ninguém trabalha de graça. Se acaso sabia qual a sua conta de água mensal. Quando por fim, de forma bruta, colocou o copo cheio no balcão o rapaz já não o quis. Saiu ofendido. Fez ele bem. Tanto veneno espumado, algum havia de ter caído ao copo.

Tristes tempos, estes, em que se nega um copo de água. É o que penso e foi o que disse. Foi algo do género, também, que lhe disse uma senhora de idade a terminar um galão e uma torrada. Era cliente habitual e nunca mais lá iria. À saida mostrou-me que levava, à revelia, o pacote de açucar não utilizado, "para ele aprender!".

O rapaz, esse, passou depois à porta com uma garrafa de água fresca comprada no café seguinte.

Coitado do senhor do café! Para além de paupérrimo de espírito, ficou mais pobre em três potenciais clientes, uma garrafa de água, e um pacote de açúcar.